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A Equipa Redactorial

domingo, 31 de maio de 2009

S. NUNO DE SANTA MARIA - Mais um Santo Português

“Vivemos em tempo de crise global, que tem origem num vazio de valores morais. O esbanjamento, a corrupção, a busca imparável do bem estar material, o relativismo que facilita o uso de todos os meios para alcançar os próprios benefícios, geraram um quadro de desemprego, de angústia e de pobreza que ameaçam as bases sobre as quais se organiza a sociedade. Neste contexto, o testemunho de vida de D. Nuno constituirá uma força de mudança em favor da justiça e da fraternidade, da promoção de estilos de vida mais sóbrios e solidários e de iniciativas de partilha de bens. Será também apelo a uma cidadania exemplarmente vivida e um forte convite à dignificação da vida política como expressão de melhor humanismo ao serviço do bem comum.
Os Bispos de Portugal propõem, portanto, aos homens e mulheres de hoje o exemplo da vida de Nuno Álvares Pereira, pautada pelos valores evangélicos, orientada pelo maior bem de todos, disponível para lutar pelos superiores interesses da Pátria, solícita por servir os mais desprotegidos e pobres. Assim, seremos parte activa na construção de uma sociedade mais justa e fraterna que todos desejamos.”
Este trecho da Nota Pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa, a propósito da canonização de Frei Nuno de Santa Maria, às 9h33 de 26 de Abril passado, em Roma, contém a “mensagem” fundamental a reter por todos nós, seus concidadãos, a nível individual e nacional.

Nuno Álvares Pereira, desde sempre conhecido por Santo Condestável, nasceu em Cernache do Bonjardim, Sertã, a 24 de Junho de 1360 e foi um nobre guerreiro que teve um papel fundamental na crise de 1383 a 1385, em que havia a possibilidade da perda da nossa independência para Espanha, já que a única filha do rei D. Fernando era casada com o rei de Espanha. Apoiante do Mestre de Aviz, (filho ilegítimo de D. Pedro I), D. Nuno Álvares Pereira bate o exército espanhol, primeiro na batalha dos Atoleiros, em Abril de 1384, e, após o reconhecimento de D. João como rei de Portugal, pelas Cortes de Coimbra, lidera um pequeno exército de 6 mil homens e derrota 30 mil castelhanos, na batalha de Aljubarrota, que viria a ser decisiva na consolidação da nossa independência nacional.
Foi casado com D. Leonor de Alvim, de quem teve três filhos, entre os quais D. Beatriz que viria a casar com o primeiro Duque de Bragança, (dando origem à Casa de Bragança). Após a morte da mulher entra na Ordem Carmelita, em 1423, com o nome de Frei Nuno de Santa Maria. Morre no Convento do Carmo a 1 de Novembro de 1431, com 71 anos.
Foi beatificado a 23 de Janeiro de 1918, pelo Papa Bento XV, que lhe consagrou o dia 6 de Novembro. O processo de canonização, iniciado em 1940, viria a ser interrompido para apenas em 2004 ser retomado.

Após a cerimónia de canonização, o Papa Bento XVI referiu-se ao novo Santo e a todo o povo português:
“Dirijo a minha saudação grata e deferente à Delegação oficial de Portugal e aos Bispos vindos para a canonização de Frei Nuno de Santa Maria, com todos os seus compatriotas que guardam no coração o testemunho do «Santo Condestável»: deste modo lhe chamavam já os pobres do seu tempo, vendo o sentido de compaixão e o despojamento de quem deu os seus bens aos mais desfavorecidos. Deixou-nos assim uma nobre lição de renúncia e partilha, sem as quais será impossível chegar àquela igualdade fraterna característica duma sociedade moderna, que reconhece e trata a todos como membros da mesma e única família humana. Em particular saúdo os Carmelitas, a quem um dia se prendeu o olhar e o coração deste militar crente, vendo neles o hábito da Santíssima Virgem e no qual depois ele próprio se amortalhou. Ao desejar a abundância dos dons do Céu para todos os peregrinos e devotos de São Nuno, deixo-lhes este apelo: «Considerai o êxito da sua carreira e imitai a sua fé» (Heb 13, 7).”

Marina Sequeira (recolha) in "A Voz de Leça" Ano LVI - Número 3 - Maio de 2009

Leça da Palmeira e o Rio Leça

Leça da Palmeira e o Rio Leça, nas Artes, nas Letras e nas Ciências, é o titulo de uma obra composta por quatro volumes e cujo primeiro teve, só agora, o seu lançamento após várias peripécias. São seus autores Albano Chaves e António Mendes, aquele há muito ligado ao mundo das letras e este ao da pintura.
Para nos referirmos a esta obra nada melhor do que transcrever as palavras do prof. A. Cunha e Silva na respectiva apresentação, e que foram as seguintes:
“Não passou ainda muito tempo que retratei a musa de Leça. Musa que tem na cabeça um esplendor!... No tronco um coração de mel!... A seus pés, passeiam todos os trilhos, alvoreceres e poentes.
Quando parecia que esta ditosa Senhora musa já estava saturada da sua existência, séculos de semeadura de tradição oral e escrita, séculos de inspiração de aguadas sobre papel ou óleo sobre tela; quando o crepúsculo da sua vida apontava para uns olhos cansados de focar a objectiva do antigo caixote fotográfico “Kodak”; ou ainda quando uns dedos trémulos e esguios de tanto exercício ao piano, nos antigos Erard, já se atrapalham entre as teclas brancas e pretas e trocam os sustenidos pelos bemóis, eis que a madame aparece toda espampanante no arquivo emocional leceiro – O Indiciário Onomástico – em bom estado de conservação, disponível para dançar a polka ou dar as cartas do bridge com as amigas, na velha “sala de visitas” de Leça da Palmeira.
Esta ressurreição deve-se ao dom de dois patriarcas do nosso tempo – o pintor António Mendes e o escritor Albano Chaves – que desceram à rua, despiram as casulas e, antes de bater a porta ao rés da rua, colocaram o báculo de pernas p’ró ar, por causa das bruxas. De telemóvel na mão e sapatilhas Reebok calçadas, andaram por aí, pelas travessas e vielas, bateram aos portões, às vidraças das casas de Leça e, onde não havia gente para dar nada, apanhavam uns restitos, uns estilhaços, os destroços que a musa deixou algures esquecidos e ao deus dará! Remexeram papéis bafientos, abriram gavetas e gavetões, consultaram a Internet e mandaram e-mails.
Resultado deste labor: com tanto restolho a musa acordou estremunhada:
- Que andarão a fazer estes dois? E ficou a saber que:
Um, o António Mendes, de pena dourada, a fazer retratos leceiros; o outro, a “retratá-los”. Da cabeça da musa com esplendor, retiraram os poetas, os pecadores; dos pés da musa os pintores, pescadores (de imagens) que, habituados às águas, meteram os seus pés e os pés dos cavaletes nos riachos, nos rios, nas águas salgadas e doces, nas areias molhadas.
Por tudo isto, o livro Leça da Palmeira e o Rio Leça nas Artes, nas Letras e nas Ciências tem cabeça, tronco e membros. É um livro que caminha, que sente emoções, que racionalmente pensa. O escritor vestiu-lhes a roupagem, o pintor deu-lhes um rosto, um olhar, é nos olhos que está o espelho da alma. Estes são os retratos dos retratados.
António Mendes e Albano Chaves acabam de doar aos leceiros as suas terras, as suas águas, as suas praias, as suas ruas, as suas vielas, as suas gentes, as suas memórias, e a musa encoberta pelas águas mil do mês de Abril andará por aí a inspirar leceiros e visitantes, não só os que andam na rua, mas também aqueles criadores infinitistas que flutuam na lua”.
Palavras estas de uma beleza tão sublime a corresponder ao teor do livro.
Ficamos ansiosos à espera dos restantes volumes.

Eng.º Rocha dos Santos in "A Voz de Leça" Ano LVI - Número 3 - Maio de 2009