“Eu queria uma casa onde os meus meninos, os abandonados da vida, pudessem ter uma atmosfera livre e benfazeja para se desenvolverem na santidade da sua vida.(…) Queria que crescessem sempre na ilustração da alma, na alegria da sua idade para que os possa ilustrar, educar, santificar e colocar para que sejam cidadãos prestimosos à pátria e às suas próprias almas.”
Foi desta vontade do Padre Grilo que nasceu a OBRA DO PADRE GRILO, sedeada desde 1963 na Rua DR. Filipe Coelho, em Matosinhos, mas que, 21 anos antes, fora a Obra Regeneradora dos Rapazes da Rua, sem edifício próprio, funcionando na casa do fundador.
Oriundo de uma família humilde de Ílhavo, Manuel Francisco Grilo nasce a 14 de Maio de 1888, (a mãe era padeira e o pai ‘marítimo’). Viria a ter seis irmãos e a formar-se no Seminário de Coimbra, diocese onde foi ordenado sacerdote em 1910, com 22 anos. Mas os seus tempos de estudante não foram apenas dedicados aos estudos teológicos, tendo também frequentado Agronomia e Medicina ao mesmo tempo que adquiria vastos conhecimentos musicais no seminário. Pelas suas ideias inovadoras a vários níveis, que já aplicava na ajuda aos mais desfavorecidos, incompatibilizou-se com as “altas esferas” civis e viria a ser julgado, condenado e expulso do distrito de Aveiro em 1913. Vem, então, viver para Leça da Palmeira, para casa de uma familiar, tornando-se Capelão da Capela de Santo Amaro, partindo daí toda a sua acção em Matosinhos. Entretanto compõe música e pinta.
Em 1928 funda a Conferência de São Vicente de Paulo da Juventude em Matosinhos, de que resulta a Sopa dos Pobres, que viria a alimentar e vestir cerca de 680 pessoas, na maioria da classe piscatória, que viva em grande miséria. Funda ainda um refúgio para crianças abandonadas e em 1932 as Escolas Católicas, criando ainda o Secretariado do Desemprego. Segue-se, na sua própria casa, a Obra Regeneradora dos Rapazes da Rua, em 1942, que passa depois para a Rua Roberto Ivens e finalmente consegue a “Obra que o consome e que o totaliza”, a sede da OBRA, na Rua Dr. Filipe Coelho, inaugurada a 28 de Julho de 1963.
Para conseguir levar por diante esta sua Obra, vai pedir pelas ruas, vai até às casas de jogo. Envolve-se no negócio das conservas, cujos lucros aplica na sua acção caritativa.
Morre a 1 de Novembro de 1967 e a 1 de Novembro de 1988, os seus restos mortais são transladados para a Capela da OBRA do seu próprio nome, correspondendo ao seu desejo de ficar junto dos “seus meninos”. Ali está, pois, nas palavras da Directora da OBRA, Dra. Conceição Sousa e Silva, “a velar pela Obra que em vida o consumiu e a atrair corações que se reencontram na caridade”.
Numa época em que tanto se ouve falar de crianças mal tratadas, a quem se retirou toda a dignidade, a OBRA DO PADRE GRILO é como um pequeno oásis, talvez não tão conhecido como outras instituições mais mediatizadas, mas bem familiar para a maioria dos habitantes do concelho de Matosinhos e com uma ligação especial a Leça da Palmeira, porque foi aqui que o seu fundador primeiro viveu e o nosso Pároco, Padre Lemos, é presidente da Direcção.
Há cerca de 20 anos nas funções de Directora Executiva da OBRA, a Dra. Conceição Sousa e Silva exerce-as com muito empenho e dedicação, mas sobretudo com muita alegria e é com um sorriso largo e um brilhozinho nos olhos que fala dos seus “meninos” e da OBRA. “Neste momento a OBRA é sobretudo um Lar, onde os rapazes são vestidos, calçados, têm cuidados de higiene e de saúde. Neste aspecto as coisas não são fáceis, mas ainda há quem ajude. Por exemplo, os tratamentos dentários são feitos na Clínica de Leça, por metade do custo.” Actualmente, a maioria dos rapazes tem mais de 10 anos e estão definidos três grandes grupos etários: um, dos mais pequenos até aos que andam no 4º ano, outro dos que andam no 2º ciclo e 7º/8º anos e o dos maiores que frequentam cursos técnicoprofissionais, com zona específica de quartos, horários para as refeições, salas para estudo separadas, salas de televisão, horas de deitar diferentes.
Professora de Físico-Química numa escola secundária de Vila da Feira, quando instada a comparar os seus “meninos” com os outros que tem na escola, não vê grandes diferenças, até nos problemas que apresentam. Os rapazes da OBRA frequentam as escolas de Matosinhos adequadas ao seu ciclo de ensino, sendo que é entre os que frequentam o 2º ciclo que tem surgido o problema do absentismo escolar. “Eles vão à escola mas não vão às aulas, e não temos forma de resolver este problema. Sabemos que entram na escola e que, pelo menos, ficam no recreio a jogar à bola. Isto só se resolve quando houver acordo entre os Ministérios da Educação e da Justiça, no sentido de trazer os professores às instituições para estes casos. No 1º ciclo não acontece porque as escolas são mais pequenas, é sempre o mesmo professor e controla-se melhor.”
Actualmente com cerca de setenta e cinco crianças, entre os dois e os dezoito anos, a OBRA DO PADRE GRILO trabalha em convénio com a Segurança Social, que para ali encaminha rapazes da região do Grande Porto, cujas famílias foram dadas como não capazes de lhes proporcionar um desenvolvimento saudável a todos os níveis. Enquanto que durante muitos anos os rapazes que eram acolhidos chegavam à OBRA de forma quase completamente informal, sem grandes procedimentos burocráticos, quase particularmente, hoje em dia, em especial desde que o caso da Casa Pia de Lisboa foi despoletado para o conhecimento público, o acolhimento tem que acontecer pelas vias legais e se não o for numa fase inicial, o processo tem que ser encaminhado para a Segurança Social, tão breve quanto possível. Apesar de oficialmente a OBRA também ser um centro de acolhimento temporário, diz a Dra. Conceição que “este temporário é um pouco ‘longo’. Temos aqui um rapaz que tinha 9 anos quando chegou e hoje tem 18. Está a preparar-se para voltar para a família. Vai viver com uma tia e tem já uma perspectiva de emprego, mas sei que preferia ficar…”.
A OBRA já teve Jardim-de-infância aberto à comunidade, mas com o aparecimento dos Centros de Acolhimento Temporário, onde é feito o diagnóstico inicial da situação da criança, deixou de se justificar a existência daquela estrutura, e agora os mais pequenitos frequentam o Jardim-de-infância da Paróquia, embora tenha uma Educadora de Infância em permanência e um espaço muito agradável para ocupar os seus tempos na casa.Além destas instalações, na Rua Dr. Filipe Coelho, no centro da cidade, a OBRA é proprietária de uma Quinta em Gondim, que foi adquirida por troca com umas casas e um terreno que recebera por testamento de um benemérito. È ali que é proporcionado aos rapazes um tempo de férias, todos os anos.
Recentemente a OBRA viu as suas instalações urbanas enriquecidas com o novo auditório recentemente inaugurado, que já permitiu a presença da família de muitos dos rapazes na festa de Natal.
Foi desta vontade do Padre Grilo que nasceu a OBRA DO PADRE GRILO, sedeada desde 1963 na Rua DR. Filipe Coelho, em Matosinhos, mas que, 21 anos antes, fora a Obra Regeneradora dos Rapazes da Rua, sem edifício próprio, funcionando na casa do fundador.
Oriundo de uma família humilde de Ílhavo, Manuel Francisco Grilo nasce a 14 de Maio de 1888, (a mãe era padeira e o pai ‘marítimo’). Viria a ter seis irmãos e a formar-se no Seminário de Coimbra, diocese onde foi ordenado sacerdote em 1910, com 22 anos. Mas os seus tempos de estudante não foram apenas dedicados aos estudos teológicos, tendo também frequentado Agronomia e Medicina ao mesmo tempo que adquiria vastos conhecimentos musicais no seminário. Pelas suas ideias inovadoras a vários níveis, que já aplicava na ajuda aos mais desfavorecidos, incompatibilizou-se com as “altas esferas” civis e viria a ser julgado, condenado e expulso do distrito de Aveiro em 1913. Vem, então, viver para Leça da Palmeira, para casa de uma familiar, tornando-se Capelão da Capela de Santo Amaro, partindo daí toda a sua acção em Matosinhos. Entretanto compõe música e pinta.
Em 1928 funda a Conferência de São Vicente de Paulo da Juventude em Matosinhos, de que resulta a Sopa dos Pobres, que viria a alimentar e vestir cerca de 680 pessoas, na maioria da classe piscatória, que viva em grande miséria. Funda ainda um refúgio para crianças abandonadas e em 1932 as Escolas Católicas, criando ainda o Secretariado do Desemprego. Segue-se, na sua própria casa, a Obra Regeneradora dos Rapazes da Rua, em 1942, que passa depois para a Rua Roberto Ivens e finalmente consegue a “Obra que o consome e que o totaliza”, a sede da OBRA, na Rua Dr. Filipe Coelho, inaugurada a 28 de Julho de 1963.
Para conseguir levar por diante esta sua Obra, vai pedir pelas ruas, vai até às casas de jogo. Envolve-se no negócio das conservas, cujos lucros aplica na sua acção caritativa.
Morre a 1 de Novembro de 1967 e a 1 de Novembro de 1988, os seus restos mortais são transladados para a Capela da OBRA do seu próprio nome, correspondendo ao seu desejo de ficar junto dos “seus meninos”. Ali está, pois, nas palavras da Directora da OBRA, Dra. Conceição Sousa e Silva, “a velar pela Obra que em vida o consumiu e a atrair corações que se reencontram na caridade”.
Numa época em que tanto se ouve falar de crianças mal tratadas, a quem se retirou toda a dignidade, a OBRA DO PADRE GRILO é como um pequeno oásis, talvez não tão conhecido como outras instituições mais mediatizadas, mas bem familiar para a maioria dos habitantes do concelho de Matosinhos e com uma ligação especial a Leça da Palmeira, porque foi aqui que o seu fundador primeiro viveu e o nosso Pároco, Padre Lemos, é presidente da Direcção.
Há cerca de 20 anos nas funções de Directora Executiva da OBRA, a Dra. Conceição Sousa e Silva exerce-as com muito empenho e dedicação, mas sobretudo com muita alegria e é com um sorriso largo e um brilhozinho nos olhos que fala dos seus “meninos” e da OBRA. “Neste momento a OBRA é sobretudo um Lar, onde os rapazes são vestidos, calçados, têm cuidados de higiene e de saúde. Neste aspecto as coisas não são fáceis, mas ainda há quem ajude. Por exemplo, os tratamentos dentários são feitos na Clínica de Leça, por metade do custo.” Actualmente, a maioria dos rapazes tem mais de 10 anos e estão definidos três grandes grupos etários: um, dos mais pequenos até aos que andam no 4º ano, outro dos que andam no 2º ciclo e 7º/8º anos e o dos maiores que frequentam cursos técnicoprofissionais, com zona específica de quartos, horários para as refeições, salas para estudo separadas, salas de televisão, horas de deitar diferentes.
Professora de Físico-Química numa escola secundária de Vila da Feira, quando instada a comparar os seus “meninos” com os outros que tem na escola, não vê grandes diferenças, até nos problemas que apresentam. Os rapazes da OBRA frequentam as escolas de Matosinhos adequadas ao seu ciclo de ensino, sendo que é entre os que frequentam o 2º ciclo que tem surgido o problema do absentismo escolar. “Eles vão à escola mas não vão às aulas, e não temos forma de resolver este problema. Sabemos que entram na escola e que, pelo menos, ficam no recreio a jogar à bola. Isto só se resolve quando houver acordo entre os Ministérios da Educação e da Justiça, no sentido de trazer os professores às instituições para estes casos. No 1º ciclo não acontece porque as escolas são mais pequenas, é sempre o mesmo professor e controla-se melhor.”
Actualmente com cerca de setenta e cinco crianças, entre os dois e os dezoito anos, a OBRA DO PADRE GRILO trabalha em convénio com a Segurança Social, que para ali encaminha rapazes da região do Grande Porto, cujas famílias foram dadas como não capazes de lhes proporcionar um desenvolvimento saudável a todos os níveis. Enquanto que durante muitos anos os rapazes que eram acolhidos chegavam à OBRA de forma quase completamente informal, sem grandes procedimentos burocráticos, quase particularmente, hoje em dia, em especial desde que o caso da Casa Pia de Lisboa foi despoletado para o conhecimento público, o acolhimento tem que acontecer pelas vias legais e se não o for numa fase inicial, o processo tem que ser encaminhado para a Segurança Social, tão breve quanto possível. Apesar de oficialmente a OBRA também ser um centro de acolhimento temporário, diz a Dra. Conceição que “este temporário é um pouco ‘longo’. Temos aqui um rapaz que tinha 9 anos quando chegou e hoje tem 18. Está a preparar-se para voltar para a família. Vai viver com uma tia e tem já uma perspectiva de emprego, mas sei que preferia ficar…”.
A OBRA já teve Jardim-de-infância aberto à comunidade, mas com o aparecimento dos Centros de Acolhimento Temporário, onde é feito o diagnóstico inicial da situação da criança, deixou de se justificar a existência daquela estrutura, e agora os mais pequenitos frequentam o Jardim-de-infância da Paróquia, embora tenha uma Educadora de Infância em permanência e um espaço muito agradável para ocupar os seus tempos na casa.Além destas instalações, na Rua Dr. Filipe Coelho, no centro da cidade, a OBRA é proprietária de uma Quinta em Gondim, que foi adquirida por troca com umas casas e um terreno que recebera por testamento de um benemérito. È ali que é proporcionado aos rapazes um tempo de férias, todos os anos.
Recentemente a OBRA viu as suas instalações urbanas enriquecidas com o novo auditório recentemente inaugurado, que já permitiu a presença da família de muitos dos rapazes na festa de Natal.
O que ajuda a manter a Obra, além dos donativos, é um pouco de tudo o que recebem, do Continente, de padarias da zona, do Mercado da Fruta, de restaurantes. Tudo é aproveitado: as roupas e o calçado são organizadas por tamanhos de acordo com o que os miúdos vestem, os alimentos são acondicionados de acordo com as suas características e preparados com os cuidados de higiene exigidos oficialmente, já que a Inspecção-geral de Saúde também ali faz “visitas” com alguma regularidade.
Depois há uma equipa de funcionários que assegura os serviços, da cozinha à lavandaria, com horários, férias e todos os seus direitos legais assegurados, que, sob a supervisão da Dra. Conceição, tornam esta instituição numa grande família e numa retaguarda forte para aqueles rapazes aprenderem a ser homens capazes de enfrentar uma sociedade às vezes tão cruel e desumanizada.
Também ali se faz um Boletim chamado “AEIOU”, onde se noticia um pouco de tudo o que acontece na OBRA e onde todos participam, dos mais miúdos aos maiores. Tivemos oportunidade de dar um vista de olhos no último número, que era, obviamente, sobre o Natal, e lá estavam anedotas com graça, a participação de alguns miúdos em equipas do Académica de Leça, histórias sobre estrelas…
A VOZ DE LEÇA agradece a disponibilidade e simpatia da Dra. Conceição Sousa e Silva, que nos recebeu e acompanhou na visita às instalações e das funcionárias, Joana, que serviu de guia em parte da visita e Araci, que foi quem nos atendeu, e nos proporcionou um primeiro contacto com a casa.
Marina Sequeira
Depois há uma equipa de funcionários que assegura os serviços, da cozinha à lavandaria, com horários, férias e todos os seus direitos legais assegurados, que, sob a supervisão da Dra. Conceição, tornam esta instituição numa grande família e numa retaguarda forte para aqueles rapazes aprenderem a ser homens capazes de enfrentar uma sociedade às vezes tão cruel e desumanizada.
Também ali se faz um Boletim chamado “AEIOU”, onde se noticia um pouco de tudo o que acontece na OBRA e onde todos participam, dos mais miúdos aos maiores. Tivemos oportunidade de dar um vista de olhos no último número, que era, obviamente, sobre o Natal, e lá estavam anedotas com graça, a participação de alguns miúdos em equipas do Académica de Leça, histórias sobre estrelas…
A VOZ DE LEÇA agradece a disponibilidade e simpatia da Dra. Conceição Sousa e Silva, que nos recebeu e acompanhou na visita às instalações e das funcionárias, Joana, que serviu de guia em parte da visita e Araci, que foi quem nos atendeu, e nos proporcionou um primeiro contacto com a casa.
Marina Sequeira
in "A Voz de Leça" Ano LII - Número 10 - Janeiro de 2006